"No plano de abertura de Paisagem na neblina, de Theo Angelopoulos, um garotinho, Alexandre (Michalis Zeke) e sua irmã pré-adolescente, Voula (Tania Palaiologou), emergem da escuridão e se aproximam de um ponto próximo à câmera. Param. A câmera começa a circular lentamente ao redor deles. Ela pergunta: 'Você está com medo?' Ele responde: 'Não, não estou. De repente de separam e começam a andar, desta vez mais rápido, em direção a uma estação de trem que agora vemos ao longe.
Essa tomada de um minuto é impressionante e define o padrão do que virá em seguida. Pessoas e veículos obstinadamente se mantendo em seus caminhos, alheios a todo o resto, algumas vezes parando, outras mudando de velocidade; paisagens desertas ou sombrias com uma única referência bem definida; sons naturais e estridentes substituídos, quando a cena se esvazia, pela música intensa de Eleni Karaindrou. E, sobretudo, a câmera de Giorgos Avanitis circulando, avançando e recuando em um ritmo e com uma intenção sempre distintos da ação, sempre gravando a curiosidade, paixão, sabedoria e o pathos do olhar de Angelopoulos.
Tais padrões dão feição e forma aos eventos deliberadamente esparsos e em aberto da trama: as crianças fogem de sua casa e tentam chegar à Alemanha de trem para procurar um pai que talvez nem exista, encontrando, em seu caminho, estranhos que podem ser prestativos ou ameaçadores. Este é um road movie sombrio mas exultante, situado em algum ponto entre as crônicas de fragmentação do pós-guerra de Roberto Rossellini e os panoramas centrados em paisagens por Chantal Akerman que retratam uma 'nova ordem mundial' vazia.
Quase nada nunca se junta nesses espaços e lugares sem nome entre Atenas e a fronteira alemã: enquanto Voula e Alexandre estão em um pátio, na frente delesum trator desatola um cavalo moribundo e, atrás deles, um grupo de convidados de um casamento sai do quadro cantando e dançando. É apenas na relação hesitante entre Voula e o músico itinerante Orestis (Stratos Tzortzoglou) que a imagem começa a zumbir com a tensão da atração e da repulsão. Contudo, isso dura apenas um pequeno e precioso intervalo de tempo: novamente essas crianças irão andar, parar e andar, ainda mais rápido, ao longo de uma estrada sem fim, enquanto a câmera se eleva bem alto no ar gélido e Orestis acena duas vezes uma despedida desamparada para ninguém."
França / Grécia / Itália (Basic, ETI, French Film Center, Paradise) 127 minutos, cor; idioma: grego; direção: Theo Angelopoulos; produção: Theo Angelopoulos, Eric Heumann, Stéphane Sorlat; roteiro: Theo Angelopoulos, Tonino Guerra, Thanassis Valtinos; fotografia: Gorgos Arvanitis; música: Eleni Karaindrou; elenco: Tania Palaiologou, Dimitris Kaberidis, Vassilis Kolovos, Gerasimos Skiadaressis, Stratos Tzortzoglou, Michalis Zeke; Festival de Veneza: Theo Angelopoulos (Leão de Prata), (Prêmio OCIC), em patado com La Leggenda del Santo Bevitore; Festival de Berlim: Theo Angelopoulos (Prêmio Interfilm - fórum do cinema novo).
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Adrian Martin, no livro 1001 filmes para ver antes de morrer (Editora Sextante, 2008).
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