terça-feira, 14 de julho de 2020

Lockdown fajuto e flexibilização capenga: receitas para um ‘puxincói’ anunciado



por Hudson Jorge

Nesse momento em que vemos os casos de covid-19 aumentando descontroladamente em muitas regiões, principalmente no Cariri, há diversos relatos de pessoas que continuam ignorando a gravidade da doença e suas consequências, seja para a saúde individual ou coletiva das pessoas ou mesmo para a economia. São festinhas nas calçadas, churrascos (quase todo mundo tem um vizinho travesso juntando amigos e assando uma carninha regada a cerveja gelada), enquanto outros se enfurnam em suas casas, abrindo mão, inclusive, de se relacionar ou fazer funerais de entes queridos.

Há um tempo atrás eu ouvi de jurista (que não me recordo o nome) que as leis e o Estado existem para proteger o cidadão, inclusive, dele próprio – na época a discussão era sobre regras de trânsito e uso da cadeirinha para crianças (porque muitas pessoas alegam que querem ter o direito de optar pela utilização ou não).

O que vemos aqui é uma sucessão de inoperâncias do Estado, influenciadas por políticas de governos.

Em todas as esferas, os governos estão sendo pressionados a flexibilizarem, inclusive, a rigidez (estranho, não?), e para isso existem vários aspectos influenciadores (economia, ideologia e eleições).

Por mais que o Estado* se esforce para oferecer estrutura mínima de atendimento para infectados, a grande preocupação passou a ser a de que o cidadão tenha um leito para morrer “dignamente”.

Os municípios não operam para fazer valer os próprios decretos estabelecidos, os governos estaduais não agem efetivamente para vigiar e punir os desobedientes, seja por falta de contingente ou por falta de organização.

Enquanto isso, acontece o que acontece: uma parcela da população se protege, se tranca, deixa de ver pai, mãe, familiares e amigos; a outra liga o “foda-se” e descumpre lindamente regras, leis e recomendações.

No final das contas, pagam todos, porque parece que ficaremos girando indefinidamente nessa roda chamada pandemia. Um “puxincói”, como diria minha vó: libera, restringe, libera e restringe. Mas, o pior é ver começar a chegar relatos de parentes e amigos infectados, alguns mortos e o povo, em todo canto, querendo fazer disso tudo um eterno Leblon.

Somos tão incapazes de controlar a pandemia, que o discurso de salvar vidas apregoado pelos governantes de estados e municípios foi revertido para a preocupação de que não faltem leitos nos hospitais.

Isso reforça uma ideia que venho batendo na tecla nas conversas informais: para o Estado somos números. Deixaram de se importar com as vidas, para se importar com os números.

Enquanto o sistema de saúde não colapsar e as pessoas não estiverem morrendo nas calçadas, como aconteceu no Equador, está tudo bem!, está tudo ótimo!, mesmo que morram dezenas, centenas ou milhares diariamente.

“Quanto mais gente morre, melhor”, porque os leitos são liberados automaticamente. Não há colapso, entendem?
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*Quando me refiro a Estado, falo dos Governos Estaduais e Municipais. O Governo Federal desde o início se mostra incapaz, ao menos, de compreender a situação, o que o torna, infelizmente, ineficaz e inoperante.

foto: Nívia Uchôa (@niviauchoa)

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