quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Trilogia do silêncio caririense



por Elvis Pinheiro

Em meados da primeira década deste século, uma sequência de três filmes produzidos na nossa região merece destaque: Adeus, Meu Bem!, Quarta Parede e Cerca, que mesmo sendo de diretores e roteiristas distintos, fazem jus por suas características, de serem reunidos sob o nome pomposo de A Trilogia do Silêncio Caririense.

Este texto não pretende ser um relatório das atividades de produção desses três curtas-metragens. Deixemos para os realizadores esse pedido, tendo em vista que um memorial dessa época será de muito valor para toda e qualquer realização de audiovisual partindo de experiências de baixo orçamento e com equipe de estreantes.

O primeiro filme dessa leva tem argumento original de Érika Dias e direção de Ythallo Rodrigues e Allison Gomes. O segundo tem o roteiro e direção assinados por Allison Gomes com codireção de Roberto Alves. O terceiro possui roteiro e direção de Glauco Vieira, mas tem como 1º assistente de direção Ythallo Rodrigues, 2º assistente de direção Roberto Alves e 1º assistente de Fotografia Allison Gomes.

O primeiro ponto que gostarei de ressaltar é que um grupo foi formado a partir do Curso de Audiovisual Modular Infovias do Desenvolvimento, financiado pelo Governo do Estado do Ceará e realizado pelo Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura e CENTEC – Instituto Centro de Ensino Tecnológico de Juazeiro do Norte. Os dois primeiros filmes são realizações diretas desse curso e toda a turma participou de sua realização. No caso de Cerca, a diferença está em que Glauco Vieira ganhou o IV Prêmio Ceará de Cinema e Vídeo e deste modo pôde contratar a equipe que incluía os professores e alunos do curso modular.

Acredito que eles não combinaram nada, mas é incrível como os filmes guardam, entre si, semelhanças interessantes: mulheres sofredoras e silenciosas como protagonistas. Todas elas numa situação limite de despedida e desapego. Contar as histórias seria arranjar briga com seus realizadores, porque não são narrativas simples e fáceis de apreender. Não possuem narrador, legenda explicativa, nem diálogos ou falas que confirmem as hipóteses levantadas pelas imagens. Mas espero que não custe muito tentar adivinhar um pouco: Em Adeus, Meu Bem! a personagem de Thailyta Feitosa está em casa sozinha fumando muito e com aspecto sofrido. O possível marido, interpretado por Gleydson Morais está, aparentemente, abandonando-a. A razão, presumimos, é a morte por afogamento de um de seus filhos. Em Quarta Parede, uma adolescente, interpretada por Bianca Alencar, está sozinha em seu quarto, também com aspecto triste e vai fotografando o espaço que logo irá abandonar, conclusão a que chegamos quando sua mãe, na pele de Carla Vanessa Prata, aparece e a chama já de malas prontas, num ambiente já totalmente vazio. Em Cerca é a vez de Orleyna Moura abandonar sua casa, talvez pela ausência da chuva que se anuncia nas nuvens, mas que não se realiza em tempo suficiente. Leva junto com ela, mesmo depois de rezas e promessas, a criança Dyanderson Gerald.

São histórias hipnóticas, com forte relação com a terra, com a posse, com o lugar. As fotografias dos três filmes, ricas em planos-detalhe e closes e câmeras paradas, montam sempre belíssimos quadros. Obras potencialmente simbolistas, estruturalmente herméticas e originalmente concebidas deverão sempre ser lembradas e revistas para que muitas histórias possam ser contadas em cima das mesmas sequências de imagens que irão dizer sempre algo de novo para os futuros espectadores.
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Elvis Pinheiro é editor da Revista Sétima e professor. Desde 2003 é Mediador de Cinema no Cariri cearense.

Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 16, de 12 de fevereiro de 2014), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.

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