"Rastros de ódio começa com o plano de uma paisagem de deserto vista de dentro de uma casa. Alguém se aproxima montado em um cavalo. É Ethan Edwards (John Wayne), voltando da Guerra Civil para a fazenda do irmão no Texas. Através de uma série de olhares e gestos, percebemos que Ethan está apaixonado pela mulher do irmão, Martha (Dorothy Jordan). No dia seguinte, ele parte com um grupo de Texas Rangers em busca de índios que haviam roubado algumas cabeças de gado. Enquanto está afastado, comanches atacam a fazenda, matando o irmão e a cunhada de Ethan e raptando suas duas filhas. Por todo o resto do filme, em atos que se passam em período de cinco anos, Ethan e Martin (Jeffrey Hunter), seu companheiro de sangue indígena, cruzam o Oeste em busca das garotas.
Como John Ford transformou esse enredo simples em um dos maiores faroestes de todos os tempos? Em primeiro lugar, há o cenário. Ford rodou muitos faroestes no Monument Valley, uma região desolada na fronteira entre Utah e Arizona. As rochas de arenito erodidas são um espetáculo extraordinário, e o olho clínico de Ford para composições as investe de uma aura especial. O próprio tamanho da paisagem faz as figuras humanas parecerem especialmente vulneráveis e a vida dos colonos texanos, precária. Como é possível tirar sustento de um lugar tão inculto e árido?
A verdadeira genialidade de Rastros de ódio está no fato de ele conseguir manter a simpatia dos espectadores por Ethan, apesar de ele ser um racista homicida. Ao fazê-lo, a fita gera uma reação muito mais complexa e produtiva do que a maioria dos filmes liberais desse filão, como Flechas de fogo (1950). Em vez de pregar uma mensagem, Ford nos conduz para as complexidades da experiência americana com a diferença racial.
Há vários outros prazeres pelo caminho, entre eles uma trilha sonora maravilhosa de Max Steiner e muito humor a cargo de membros da Sociedade Anônima John Ford, como Harey Carey Jr., Ken Curtis, Hank Worden e Ward Bond. Vera Miles está excelente como Laurie, a namorada de Marty, cuja mãe é interpretada por Olive Carey, viúva do primeiro astro do faroeste de Ford, Harry Carey.
Em 1992, Rastros de ódio foi votado como o quinto melhor filme de todos os tempos em uma enquete com críticos de cinema de vários países promovida pela revista Sight & Sound. É uma honra e tanto, mas o filme de Ford faz jus a ela."
Estados Unidos (Whitney, Warner Bros.) 120 minutos. Technicolor; idioma: inglês; direção: John Ford; produção: Merian C. Cooper, Patrick Ford, C. V. Whitney; roteiro: Frank S. Nugent, baseado no livro de Alan Le May; fotografia: Winton C. Hoch; música: Stan Jones, Max Steiner; elenco: Jonh Wayne, Jeffrey Hunter, Vera Miles, Ward Bond, Natalie Wood, John Qualen, Olive Carey, Henry Brandon, Ken Curtins, Harry Carey Jr., Antonio Moreno, Hank Worden, Beulah Archuletta, Walter Coy, Dorothy Jordan.
Edward Buscombe, no livro 1001 filmes para ver antes de morrer (Editora Sextante, 2008).
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Rastros de ódio será exibido nesta segunda-feira (29-10-2012), na Mostra John Ford, no Cinemarana do SESC Crato-CE.
Para mais informações do evento, clique aqui.
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