quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Entrevista com o cantor e compositor Geraldo Junior

montagem com fotos de Júlia Guimarães

por Luís André Bezerra

O cantor e compositor Geraldo Junior, natural de Juazeiro do Norte, é uma figura conhecida há bastante tempo da cena artística caririense. Ainda nos anos 1990, quando era conhecido como Junior Boca, assumiu o vocal de algumas bandas de rock e durante mais ou menos uma década foi a voz da banda Dr. Raiz, da qual era também um dos principais compositores, ao lado do guitarrista Dudé Casado. Junior Boca partiu para carreira solo e passou a assinar os trabalhos como Geraldo Junior, e não para de realizar diversos trabalhos artísticos, dos quais ele nos fala um pouco nesta entrevista.

ilustração de Boni
O BERRO - Há alguns anos você fixou residência no Rio de Janeiro e periodicamente volta ao Cariri para fazer shows, como neste mês de setembro, com uma apresentação no Juazeiro e outra no Crato. O que há nestes shows da musicalidade do “velho Geraldo Junior”, que muitos conhecem desde os tempos de Dr. Raiz, e o que há de novidade para o público caririense?
GERALDO JUNIOR -
Há cinco anos estou passando mais tempo fora, no Sudeste, mais precisamente no Rio de Janeiro. Como todos sabem, sempre que posso venho por aqui [ao Cariri], para não perder as referências (risos). E também realizar trabalhos, sejam eles de música, produção cultural e arte-educação em instituições das quais faço parte, como a ONG Beatos (Crato-CE) e a Oficina Casa do Alto (Caririaçu-CE). No momento estou com um show novo e as novidades são os sintetizadores, com timbres mais alternativos. Além da analógica, agora brincamos um pouco com a música digital e eletrônica.  Infelizmente para esses dois shows [em setembro] ainda não apresentarei esse trabalho inédito. Talvez para outubro ou novembro na Mostra [SESC Cariri de Culturas], quem sabe?!... Nos shows do dia 22 [passado], no SESC Juazeiro, e dia 29 próximo, no Cruzeiro do Crato (pelo SESC Crato) serão apresentadas músicas dos álbuns Dr. Raiz, Calendário e Warakidzã. Estou curtindo muito o som da banda, formada por grandes músicos da região que têm seus trabalhos e também participam de vários outros projetos: Ranier Oliveira (sintetizador, teclado e vocal), Geraldo Junior (voz, flauta, trompete e percussão), Anderson Matos, o Jhoe (guitarras e vocal), Ricardo Miranda (baixo e vocal) e Remy Oliveira (bateria e percussão).

Como tem sido sua interação com os artistas do Rio de Janeiro e com os velhos conhecidos que ficaram no Cariri? Nos tempos de internet, até que ponto a distância impossibilita o intercâmbio artístico?
O Rio vem sendo muito positivo! Amigos, parceiros de trabalho... Tenho realizado shows importantíssimos, em projetos como a Cúpula dos Povos, Noites de Parangolés (Teatro de Anônimo - Fundição Progresso), UFRJ na Cidade, Festival Santa Música, Kombi Voadora, SESCs, SESI, Tendas Culturais, além dos shows fora do Rio. Lá tenho o prazer de contar com grandes músicos de vários lugares que conheci na cidade maravilhosa, entre eles principalmente Cláudio Lima e Eduardo Karranka (da Bahia), Filipe e Marcelo Müller (do Rio Grande do Sul), Gabriel Pontes (do Rio de Janeiro) e o Beto Lemos, que já é um velho conhecido de todos nós [do Cariri]. Quando venho pro Nordeste toco com os músicos do Cariri: Ranier e Remy Oliveira, Ricardo Miranda, Anderson Matos, Ramon Oliveira, Junior Casado, Pantera. E também quando há oportunidade, quando ele está por aqui, com Dudé Casado, que agora é internacional (risos). Enfim, tenho a sorte de poder contar com grandes parceiros de trabalho, que além de tudo são grandes profissionais, e amigos, claro.

Fazendo uma menção ao título de uma canção que você regravou de Abidoral Jamacaru, creio que seu último disco, Warakidzã - Senhor do Sonho (2011), veio “mais tarde e mais forte” em comparação ao primeiro álbum, Calendário - O Tempo e o Vento (2007). E essa sonoridade, digamos que mais “elétrica e eclética” do disco mais recente, foi algo planejado ou se deu em decorrência da nova forma(ta)cão da banda que o acompanhou na gravação do disco?
As duas coisas. Eu sempre fui aberto pra tudo e nunca tive preconceitos musicais, gosto de tudo e não tenho barreiras para compor. O disco Calendário surgiu de uma vivência mais direta com grupos de tradição, eu e Beto Lemos trabalhamos a direção e os arranjos a partir da realidade da época, sem querer colocar o carro na frente dos bois. Descartamos a possibilidade de outros instrumentos e sonoridades, mas também curtimos fazer o trabalho da forma que deu pra fazer, com participação de músicos da região: Lifanco, Darlan, Cícero Tertuliano, Flauberto, Antônio Queiroz, e também no Rio: Rebeca e Joana Queiroz, além da essencial contribuição de Ibbertson Nobre como técnico de gravação, mixagem e masterização. No novo álbum [Warakidzã] tivemos mais tempo e oportunidade de brincar mais, contar com diversas possibilidades e instrumentações. Aproveito e já adianto que estou na pré-produção do novo disco, juntamente com Beto Lemos, dividindo composições, arranjos e execução de vários instrumentos, e Ricardo Cotrim (percussão, programações, sintetizadores, kaoss pad, etc.). Nesse nosso trabalho vamos fazer algo bem diferente! (risos) Estou curtindo muito as novidades.

Mesmo morando a milhares de quilômetros do Ceará, suas músicas e letras continuam remetendo bastante à região do Cariri. É algo planejado, intencional? Ou, involuntariamente, cantar esses temas acaba servindo para matar um pouco a saudade, compensar a distância da terra natal?
Inevitavelmente minhas composições passam de uma forma ou de outra pela essência do Cariri. Mas claro que nunca vi isso como uma limitação, é apenas o meu norteio, meu porto seguro. Penso que a cada nova influência e experiência, com o passar do tempo, vou ampliando as possibilidades de trabalho e de expressão artística. Cada novidade é mais uma ferramenta pra caixinha de surpresas.

foto de Lili Rodrigues
Você já gravou três CDs (sendo um com a banda Dr. Raiz). Pensando nos próximos passos da carreira, enquanto artista independente, o melhor será investir mais em shows, viajando com os trabalhos já gravados, ou já ampliar essa discografia?
São três discos e ainda várias coletâneas de música independente e de festivais com tiragem nacional, e alguns internacionais. E quero ampliar sim [a discografia], sempre. Tenho muitas músicas minhas e de parcerias que não foram gravadas, porque ainda não encontraram o seu momento dentro de um álbum ou single. Como falei, agora estou na pré-produção de um novo disco e no Sudeste já venho apresentando um show com esse repertório. E sobre os shows, é o que nos dá um retorno para podermos viver da música. Os discos acabam sendo como um cartão de visita, mas também ajudam no orçamento quando os vendemos nos shows ou pela internet.

Atualmente a internet é o único meio para se divulgar discos independentes? Ou há, por exemplo, algumas rádios cariocas que acolhem esses trabalhos?
A internet hoje é o principal meio, mas já existem vários programas de TVs e rádios que dão espaço pra esse tipo de música. Já fiz vários programas de rádio no Rio, alguns em nível nacional. Já nesta minha temporada aqui dei uma entrevista por telefone para a Rádio FM 94 Roquette Pinto [do Rio de Janeiro].
 
Finalmente, fale um pouco sobre a Terreirada Cearense, evento que você comanda no boêmio bairro da Lapa, no Rio de Janeiro. O público dos shows é formado basicamente por nordestinos? E você acredita que o Cariri teria público para sustentar um projeto desse tipo, com shows periódicos, divulgando a música “nordestina alternativa”?
A Terreirada Cearense é um projeto paralelo que surgiu com um coletivo de amigos, outros artistas, os músicos que tocam comigo e a minha produtora na época, Beth Fernandes. Tivemos essa ideia como uma estratégia de divulgação do meu trabalho e também para receber os amigos e artistas afins que estavam pelo Sudeste. Já estamos há quatro anos fazendo essa brincadeira no coração da noite carioca. Uma embaixada da música cearense no Rio de Janeiro! E as pessoas ficam apaixonadas pelo trabalho e eu me sinto honrado em falar isso, trabalhamos com muito carinho. E o Cariri tem sim condições de manter um projeto desse tipo, inclusive essa é umas das formas de lutar contras as estruturas do mal que estão aí, dominando todo o mercado. Rádios, TVs, eventos públicos, internet, formar coletivos e apresentar uma outra referência musical e/ou de outras linguagens é uma iniciativa poderosíssima! E aí a possibilidade de dar certo é grande, porque trabalhamos com arte, algo feito com o coração (num extremo oposto do mercado). Mantendo o projeto a médio e longo prazo, ele dará um retorno.
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Acesse o site oficial de Geraldo Junior: http://www.geraldojunior.com.br
Faça o download ou escute online o disco Warakidzã, clicando aqui.

"Treme-terra (ou Grito de Guerra)", do álbum Warakidzã, ao vivo em 2010:

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