quarta-feira, 22 de julho de 2020
9 (+1) livros sobre Juazeiro do Norte - Parte 1
por Ythallo Rodrigues e Luís André Araújo
“Juazeiro é uma terra de pouca geografia e muita história”. Com essa frase, Monsenhor Murilo de Sá Barreto naturalmente se referia a toda a riqueza de fatos, histórias e culturas na vida de um município relativamente novo e com pouca extensão territorial.
E neste 22 de julho – dia da emancipação política do município – para ilustrar que o que não falta é história sobre o Juazeiro, resolvemos lançar a primeira de uma série de listas com livros que contam muitos dos fatos ligados à gênese e ao desenvolvimento de Juazeiro do Norte, em seus aspectos religiosos, políticos, econômicos e culturais.
Assim sendo, é importante pontuar algumas questões:
A produção editorial e acadêmica de trabalhos sobre Juazeiro é vastíssima, mas as listas são finitas, implicando no inevitável: muita coisa boa (e importante) naturalmente (e infelizmente) ficará de fora.
Como faremos mais de uma lista (aguardem as próximas!), possivelmente um livro não contemplado agora pode ser citado numa próxima postagem.
Para tentar diversificar as épocas, estilos, autores e autoras das obras, a lista não segue um critério de importância/relevância da publicação, então colocamos em ordem cronológica, considerando a data de lançamento da primeira edição.
Ressaltamos que a lista não é assinada por especialistas na história do Juazeiro e sua religiosidade, mas O Berro resolveu se lançar nessa missão por sempre demonstrar um eminente interesse e admiração pelo assunto, como quem se surpreende com a riqueza de cada história deste lugar. Então as listas surgem dessa curiosidade e admiração.
Por fim, enfatizamos que não estão sendo listados, necessariamente, livros com qualquer tipo de temática ligada ao Juazeiro ou pelo fato do escritor ou escritora ser juazeirense. A ideia é enumerar livros “sobre o Juazeiro”, com temáticas caras à sua origem e desenvolvimento enquanto município, no que se refere às questões religiosas, à história do Padre Cícero e/ou da Beata Maria de Araújo (e demais religiosos conhecidos), das romarias, etc., também pincelando aqui e acolá as questões econômicas, políticas e culturais.
Boa(s) leitura(s)!
O Padre Cícero que eu conheci (verdadeira história de Juazeiro) - Amália Xavier de Oliveira (Gráfica Olímpica, 1969): o livro da professora e memorialista Amália Xavier busca descrever a vida de Padre Cícero, tendo como recorte o período em que este viveu em Juazeiro, entre 1872 e 1934 (ano de sua morte). O texto que abre a edição de 2001 é uma carta da escritora Rachel de Queiroz, de 1968, com considerações que demonstram algumas características importantes do texto da professora juazeirense: “Estou acabando a leitura de seu livro O Padre Cícero que eu conheci. E quero agradecer a distinção que me fez, proporcionando-me a leitura em original, desse depoimento honesto, veraz e fiel. Sabe quanto venero a figura do nosso padrinho Padre Cícero; é uma dor de coração ver esses ‘depoimentos’ e ‘interpretações’ que saem por aí, assinados por aventureiros, por pessoas que se querem beneficiar da glória do nosso santo – ou por conhecidos inimigos dele. O seu livro vem pôr a verdade no seu lugar. É claro, sincero – e se é apaixonado, algumas vezes, – será desse paixão da justiça, que reclama quando vê a mentira entronizada.”
Milagre em Joaseiro - Ralph Della Cava (Paz e Terra, 1976): publicado originalmente em 1970 nos Estados Unidos – com a primeira edição brasileira lançada em 1976 – tornou-se importante referência pela apreciação e divulgação de documentação até então inédita sobre o “Milagre da hóstia do Juazeiro”, protagonizado pela Beata Maria de Araújo e pelo Padre Cícero. Ralph Della Cava, um historiador e antropólogo estadunidense, acabou apresentando, assim, um dos trabalhos de grande fôlego sobre a formação e desenvolvimento de Juazeiro do Norte, calcado no fenômeno religioso do fim do século XIX e impulsionado ainda com mais vigor durante o século XX. O livro – lançado originalmente pela Paz e Terra e reeditado em 2014 pela Companhia das Letras – estimulou tantos outros trabalhos acadêmicos e produções audiovisuais sobre a história do Padre Cícero e de Juazeiro.
Juazeiro do Padre Cícero: a terra da mãe de Deus - Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros (Francisco Alves, 1988): nesse estudo pioneiro, desenvolvido no decorrer da década de 1970 e apresentado como tese de doutorado em 1980 pela antropóloga Luitgarde Oliveira, acompanhamos o percurso de constituição histórico-social do sertanejo, em que seguimos até a vila de Juazeiro em seu nascedouro no final do século XIX e a partir de lá somos convidados a entender os meandros do catolicismo popular na formação de Padre Cícero como um dos ícones desta categoria. O livro segue pelo século XX, observando a relação estabelecida entre os romeiros de Padre Cícero e a cidade que é o espaço sagrado da devoção de toda a gente do Nordeste que compõe as romarias. Na edição mais recente, de 2014, há ainda o acréscimo de um quarto capítulo que delineia alguns aspectos da chegada do Juazeiro de Padre Cícero no século XXI.
Juazeiro do Padre Cícero - Raimundo Araújo (org.) (Gráfica Mascoto, 1994): em 1994 Juazeiro tinha algumas datas importantes para comemorar – no sentido de trazer à memória, recordar: 80 anos da morte da Beata Maria de Araújo; 80 anos da Sedição de Juazeiro (a famosa “Guerra de 14”); 80 anos da elevação da condição de vila a cidade; 60 anos da morte do Padre Cícero e 150 anos do seu nascimento; 25 anos da inauguração da estátua do Padim no Horto... ufa! (correndo o risco aqui de esquecer outras efemérides importantes daquele ano). Para homenagear tantos fatos relevantes, o escritor Raimundo Araújo, um dos grandes entusiastas da história de Juazeiro, organizou essa antologia com textos dos mais variados profissionais, moradores, admiradores e estudiosos da história da cidade. Nas páginas do livro são explorados diversos assuntos e temos uma seção com fotografias, que hoje provocam um certo saudosismo, pois já se vão 26 anos do lançamento dessa obra impressa pela tradicional Gráfica Mascote.
Maria do Juazeiro: a beata do milagre - Maria do Carmo Pagan Forti (Annablume, 1999): dentre os mais variados assuntos e personagens que fazem parte da história de Juazeiro do Norte e do Cariri, para a equipe d’O Berro a Beata Maria de Juazeiro merece um destaque especial. Sendo assim, naturalmente haveríamos de mencionar uma das primeiras obras com um certo fôlego que se debruçou especificamente na figura de Maria Magdalena do Espírito Santo de Araújo. Coube então à psicóloga e professora Maria do Carmo Pagan Forti levantar uma questão que sempre merece um debate mais profundo: após o caso do milagre da hóstia, ocorrido em 1889, o Padre Cícero tornou-se o líder e grande referência de um dos maiores fenômenos sócio-religiosos da história do Nordeste brasileiro: as romarias de Juazeiro; entretanto, a grande protagonista daqueles fatos, a Beata Maria de Araújo, foi sendo apagada da história, tendo seu nome e sua importância poucas vezes lembrados no fenômeno em que se transformou o Juazeiro. Maria do Carmo não hesita em tomar partido e defender a beata de todas as acusações sofridas durante o processo eclesiástico que condenou Maria de Araújo ao enclausuramento e esquecimento nos seus últimos anos de vida – e em boa parte da história.
Padre Cícero: poder, fé e guerra no sertão - Lira Neto (Companhia das Letras, 2009): com uma considerável lista de personagens da história brasileira no seu currículo como biógrafo, o jornalista e escritor cearense Lira Neto também se debruçou sobre a história do Padre Cícero. O resultado dessa pesquisa foi o livro Padre Cícero: poder, fé e guerra no sertão, que apresenta uma narrativa baseada em vasta documentação sobre a riquíssima e surpreendente história que envolve as questões políticas e religiosas da ascensão do Padim Ciço no sertão nordestino. Sem esnobar o mérito de sua pesquisa historiográfica, vale mencionar a recorrência de escutarmos leitores do livro falarem que se trata de uma narrativa instigante, envolvente, por ser uma história (de certa forma) “romanceada”, prendendo o leitor com um texto que flui facilmente, prendendo a atenção a cada página. Por fim, também vale citar o peso da editora Companhia das Letras e a sua capacidade de distribuição nacional, que fizeram desse livro um importante divulgador da história do Padre Cícero em todo o território brasileiro.
O teatro de Deus: as beatas do Padre Cícero e o espaço sagrado de Juazeiro - Edianne Nobre (Editora IMEPH, 2011): em seu primeiro livro, a professora e escritora Dia Nobre narra as histórias que estão em torno dos milagres de Juazeiro, a partir da perspectiva das nove beatas que acercavam o Padre Cícero em seu itinerário de fé. A partir da forma clássica de um texto dramatúrgico em três atos, a autora vai desenvolvendo em cada uma das cenas o desenrolar dessa história intrincada (iniciada nas últimas décadas do século XIX) e tramada por inúmeras vozes e contextos diversos. Fatos históricos (ou místicos) que reverberam até hoje na cidade em que Juazeiro do Norte se transformou. Ao final do percurso do livro a autora reafirma a potência “do fato extraordinário que é um pequeno povoado sombreado por juazeiros crescer no meio do nada e se transformar em um caloroso e famoso centro de religiosidade católica”. A obra faz parte da importante Coleção Centenário, lançada em 2011, quando foram comemorados os 100 anos de Juazeiro, e a autora posteriormente lançaria uma obra de grande impacto sobre a Beata Maria de Araújo – mas isso é assunto paras as próximas listas...
A Praça Padre Cícero - Daniel Walker (Expressão Gráfica e Editora, 2017): praticamente toda cidade possui uma praça que poderia ser chamada de “o coração da cidade”. E parece que não foi por acaso que um livro sobre a Praça Padre Cícero fosse capaz de representar toda dedicação de uma vida do professor, historiador e escritor Daniel Walker a Juazeiro do Norte – e, lógico, ao Padre Cícero. Lançada em 2017, a obra foi fruto de uma longa pesquisa (de mais de 5 anos) que esbarrava na falta de acervos públicos mais cuidadosos em registrar a história do nosso povo e das nossas cidades. Mas Daniel Walker abraçou a missão, consultando escritos e ouvindo “causos” de tantas pessoas que viveram muitas histórias na famosa praça, com destaque especial para as décadas de 1960 e 1970, quando, segundo o próprio autor “ela esbanjou todo o seu glamour e ficou cravada na memória de todos nós, como sendo nosso local de lazer e namoro”. O resultado é um livro com muitas histórias, informações e um rico acervo fotográfico.
Juazeiro sem Padre Cícero: expectativas e temores gerados pela morte do Padrinho (1934-1969) - Amanda Teixeira da Silva (Editora CRV, 2018): já a obra da professora e historiadora Amanda Teixeira segue o percurso temporal imediatamente posterior à morte de Padre Cícero, até o final na década de 1960. Na contracapa da primeira edição Amanda traça uma breve sinopse do seu trabalho. “Padre Cícero morreu em 1934. Havia, no período, diferentes expectativas sobre o que seria Juazeiro após o desaparecimento de seu fundador. Para muitos jornalistas, a morte de Padre Cícero representava um problema econômico, constituído pelo possível esvaziamento da cidade e pela fuga de mão de obra do Nordeste para o Sudeste e o Norte do país. Alguns temiam ainda possíveis acessos de fanatismo ou a consolidação de um problema social, já que os romeiros e retirantes ficariam então sem o apoio espiritual, moral e material do sacerdote. Para os devotos, por outro lado, o desaparecimento do Padrinho significava o fim da relação pessoal com um santo que falava a língua dos pobres e nunca se negava a ouvir e auxiliar os necessitados. De certo modo, a persistência de Padre Cícero nos corações de seus seguidores surpreendeu os intelectuais e as autoridades religiosas que planejavam dar fim à sua memória. A morte não foi capaz de eliminar o Padrinho. Juazeiro sem Padre Cícero passou a ser Juazeiro com mais Padre Cícero do que se imaginava.”
+1. A mulher sem túmulo - Nilza Costa e Silva (Armazém da Cultura, 2010): “Maria foi a segunda beata a receber a hóstia. Tomou um susto. Sentiu alguma coisa estranha em sua boca, um gosto de sangue... Teve vontade de expulsar aquilo de dentro de si, pois não sabia o que era. Terminou cuspindo tudo sobre a palma da mão. Só aí notou, visivelmente pálida, que a hóstia estava sangrando.” O livro de Nilza Costa e Silva através dos fatos romanceia a história de Maria de Araújo, a beata protagonista dos milagres da hóstia consagrada, a renegada santa de Juazeiro. Em 1930 o túmulo de Maria de Araújo foi violado e destruído por oficiais da igreja católica, um mistério que paira sobre a hoje populosa Juazeiro do Norte, e que faz ecoar a pergunta trazida ao final deste romance: “Onde está Maria de Araújo?”
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Excelente trabalho. Parabéns aos autores.
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