sexta-feira, 19 de julho de 2013

Pela vontade do povo, Raimundão encurralado de novo!

por Hudson Jorge

Raimundão recebeu o convite para participar da solenidade de posse da reitora da UFCA. Vestiu seu terninho preto, penteou seu bigode de ferro, estendeu o convite para seu secretário de  desenvolvimento José Roberto Celestino e vualá.

Durante a solenidade, ao ser chamado à mesa, recebeu logo de cara uma sonora vaia dos  estudantes, que em seguida improvisaram cartazes e palavras de ordem que lembravam ao prefeito o  quanto ele tem esquecido de valorizar a educação.

Raimundão enrubesceu. Não se sabe se de raiva ou de vergonha. Nem numa praia do Equador, ao meio-dia, seria possível encontrar alguém tão vermelho. Via-se claramente que ele se esforçava o quanto podia para ler os cartazes, mas encontrava sérias dificuldades, pois os estudantes andavam em círculos e não dava tempo ele juntar as sílabas.

Com o fim da solenidade, mais vaias. E Raimundão avermelhou-se ainda mais ao ponto de garantir um belo destaque para seus bigodes brancos. De repente, alguém grita na multidão: O que é que falta para encurralar Raimundão? Uma agência do Banco do Brasil? De repente, os estudantes cercaram o bom velhinho e começaram a reivindicar, entre outras coisas, que ele tapasse os buracos das ruas e que asfaltasse a avenida que dá acesso à Universidade.

Raimundão fingia seguir tranquilamente seu caminho como se nada estivesse acontecendo. Os estudantes o seguiram até o carro do seu secretário, bloquearam a saída do estacionamento e gritaram por  reivindicações mais do que justas. Dessa vez não havia soldadinhos de chumbo, não havia polícia, cassetetes e nem spray de pimenta.

A leitura labial captou a seguinte frase de Raimundão. “Tamu lascado!”. Em seguida, Roberto Celestino saltou do carro e reclamou pelo seu direito de ir e vir, ao passo que os estudantes replicaram solicitando que também tivessem o direito de ir e vir por ruas dignas, sem buracos e com pavimentação adequada. Celestino também pediu calma,pois Raimundão já é um velhinho de setenta anos e não merece passar por coisas desse tipo, “vejam meus amigos, como salta o coraçãozinho dele, pia!”.

Enquanto Celestino procurava manter diálogo com os manifestantes, Raimundo Macedo tentava se  esconder no carro, suando feito um cassaco encurralado. De fora, podia-se ouvir o coitado debulhando um rosário e clamando ajuda aos céus. Seus lábios bibicavam algo como uma promessa de que se escapasse vivo de mais uma daquelas, agora sim, seria um bom moço e um bom prefeito, com direito a honestidade e mais um monte de coisa. No seu delírio, prometia trabalhar de verdade para o desenvolvimento da cidade com intuito de beneficiar a população e não apenas alguns grupos de amigos e empresários.

De repente, num surto de coragem, Raimundão saiu do carro, bateu o pé e gritou:

- Ucês num vão sair da frente, não??

- Não! - gritaram os estudantes uníssonos.

- Num vaum mesmo?, pergunta novamente, torcendo o bigode.

- Não! Queremos dialogar e apresentar nossos desejos de mudança!

- Entonce, vou mim bora de pés! - E rompeu no meio da multidão como um torpedo em disparada. Caminhou apressadamente, quase às cegas, pela rua mal iluminada, caindo nos buracos que ele próprio cultiva com tanto gosto. Quando viu que havia buraco demais, entrou pelo meio do mato, escorregando pela ribanceira, tropicando em tocos e latas. E os estudantes continuavam atrás numa gritaria medonha!

Eis que surge um carro que abre as portas. Seria um resgate? Oh sim, seria. Raimundão entrou cheio de medo e carrapicho nas canelas. Quando os estudantes se prepararam para mais um cerco, surge pela janela do carro um cano com um cãozinho na extremidade oposta.

Os estudantes se afastaram com medo abrindo espaço para que o carro em que estava o prefeito fugisse em alta velocidade pela buraqueira da avenida. Indignados foram reclamar com o secretário Roberto Celestino que acompanhava tudo a uma certa distância. Quando se aproximaram mais uma vez de seu carro, arrancou velozmente, deixando para trás alguns estudantes assustados e outros caídos no chão.

Depois disso, os estudantes ficaram se perguntando que tipo de democracia era aquela.
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Para ler texto sobre Raimundão encurralado no Banco do Brasil, clique aqui.

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