terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Lições de pedra, de amor e de poesia



por Elandia Duarte

Sala lotada, encerra-se a premiação do 8º festival de Cinema de Triunfo – PE, realizado do dia 03 ao dia 08 de agosto do corrente ano. Semana cheia de encontros, trocas e descobertas. Maratona diária de uma média de seis filmes, sendo um longa e o restante curtas, e ainda debates, oficinas, filmagens, cachaça, música, alegria, ufa! E ainda anunciam um longa que será exibido essa noite? Após a premiação? E toda essa rotina exaustiva, produtiva, enriquecedora, mas exaustiva?! Deus me ajude!

Bem vamos lá, pensei eu comigo mesma. Vou tentar ver. O diretor é aquele cara simpático e de ar leve com quem conversei ontem à noite sobre mudanças no cabelo por pura rebeldia, leveza e poesia como alento de vida. Não quero ser indelicada, além de tudo, ele fez a abertura da sessão com a leitura de “uma educação pela pedra” do João Cabral, vou tentar ficar. Fiquei. E que bom que fiquei!

O filme que se seguiu a essas minhas epifanias foi A história da eternidade, escrito e dirigido por Camilo Cavalcante. Deslumbrante, arrebatador do primeiro ao último plano. “Um filme que fala de amor e de desejo”, nas palavras do próprio Camilo. Para mim, mais que amor e desejo, o filme traz à tona de forma poética e imensamente lírica esses dois polos na perspectiva do feminino. Destaca a sexualidade, as ânsias do corpo e do sentir gozo tão negados a nós mulheres.

É de poesia que explode em imagens e nas lindas performances envoltas de músicas e de declamações de poemas feitas primorosamente pelo João, personagem do ator Irandhir Santos, que o filme preenche. A película transborda, despedaça e reluz na alma.

Um sertão seco nas paisagens, mas não na ternura dos personagens. Um sertão submerso de poesia, um sertão que vira mar no coração e pelos olhos cerrados de Alfonsina, vivida por Débora Ingrid, e que se estilhaça para quem, ao contrário da personagem, mantém os olhos bem abertos e atentos às imagens na tela. Tem-se ainda as não menos belíssimas atuações de Marcélia Cartaxo e de Zezita Matos, dando beleza e intensidade às personagens por elas interpretadas. O filme é ainda dedicado a Dominguinhos, que faleceu em 2013 e que junto com Zibgniew Preisner (autor das músicas dos filmes do Krzystof Kieslowski) compõe a trilha sonora original, elemento fundamental na construção da atmosfera delicadamente seca e poética do sertão apresentado pelo filme.

Saí da sessão em êxtase completo, flutuando mesmo, me sentindo sem pisar no chão. E afirmando para mim mesma e para quem perguntava sobre as minhas impressões sobre o filme: - Não quero desmerecer nenhum dos belíssimos filmes que vi aqui durante essa semana, me fizeram melhorar muito enquanto gente, enquanto pessoa. Crescer mesmo. Mas se tivesse feito essa mesma viagem e tivesse assistido apenas essa sessão de hoje, já teria valido a pena. Teria valido muito, muito a pena.

A história da eternidade é um afago no corpo, um hiato na dureza do cotidiano e um sopro poético na feiura do mundo.
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Elandia Duarte possui graduação em pedagogia pela Universidade Regional do Cariri (2008) e Especialização em Arte/Educação pela mesma Instituição. É professora, integrante do Grupo de estudos de Cinema Sétima e colaboradora na revista do grupo que carrega o mesmo nome. Compõe juntamente com mais quatro artistas o Coletivo Diadorins, e por fim, mas não menos importante é poeta e vez ou outra arrisca amadoramente no oficio de atriz.

Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 24, de setembro de 2015), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.

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