quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Poesia do riso e erotismo



por Amador Ribeiro Neto

Expedito Ferraz Jr. (Maceió, 1970) é poeta, ensaísta, crítico literário e professor de Teoria da Literatura na Universidade Federal da Paraíba. Com Poheresia (João Pessoa: Editora A União, 2014) estreia delimitando o território que lhe cabe. E que ele generosamente entrega ao leitor. É o campo da secura braba. Da palavra contida. Da emoção a conta-gotas. Do poema pensado a partir do que o poeta sente. Mas é também espaço do chiste e do erotismo.

Drummondiano aqui, acolá esbarra em Augusto de Campos/Cummings, pra resvalar no melhor do Leminski. Do primeiro, a matéria viva do cotidiano. Dos segundos, a parcimônia do vocábulo in essencia, desenhado no branco da folha. Do último, os trocadilhos e o humor que reverberam no título do volume e espraiam-se por vários poemas.

Lê-se Poheresia com leveza na alma e riso maroto nos lábios. E a arquitetura dos poemas fica ainda mais bela por não se enxergar os alambrados que esconderam sua feitura. Tudo pronto, assim que é bom. E é nesta gostosura que sua poesia atinge o leitor. Seja ele um fruidor de poesia. Ou um chato-boy à caça de novidades no poema. A ambos a poesia de Expedito Ferraz Jr. seduz. Com leveza, graça e inventividade.

O tríptico de poemas com o tema “céu” (de Van Gogh, Buñuel, Bashô) recorta a cena pictórica de cada um destes artistas com a condensação de ideias e imagens dignas do minimalismo mais fecundo. O haicai dedicado a Bashô pode ser lido de cima pra baixo e vice-versa. Ambos os movimentos de leitura refletem a beleza do céu espelhado no lago. E realçam os riscos do mergulho ingênuo da rã: “Lobo sob a lã: / disfarçado em céu / o lago engole a rã”.

Se o cinismo à la Sterne ronda os poemas, é bom não perder de vista a grande asa da sedução que os poemas arrastam pelo e para o leitor. O erotismo desponta de variados modos. Sarcástico em “I’m Donne”: “em / templos / de culto ao corpo / só creio / na consagração / do / corpo / alheio”. Torna-se delicado em “Duília”: “agora / sei os / teus / seios / a que / sabem”. E volta corrosivo em “1º motivo da amada inculta”: “O pastor que não quis Lia, / O cisne que iludiu Leda, / O ledo engano de Inês: / / Só a ti, inculta amada, / é que o amor não diz nada? / Só tu, Vesta, não o vês?”.

É na contramão da via de mão dupla que o poeta dirige sua poesia. Sabe que o caminho do fácil é dificultoso. No entanto, a coloquialidade que consegue espanta pela naturalidade. E, ao encontrarmos a intertextualidade com artistas dos mais variados códigos, constatamos que o pesquisador de Semiótica sabe criar semioticamente. E cria muito bem. A ponto de lermos sua poesia no balanço das redes pessoais, sociais ou... das varandas. Enfim: no vaivém da vida gostosa.

Assim, Poheresia, reunindo 25 anos de produção de Expedito Ferraz Jr., segue como obra oblíqua na contracorrente da mesmice enjoativa de grande parte da poesia atual. O leitor está diante de uma poesia parcimoniosa. Inteligente. Chistosa. Sensível. Irônica. Exata. Que se lê entre delícias. Voltando nas páginas. Pedindo mais. Querendo bis. À espera de novo livro. Evidentemente. 
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Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 26 de dezembro de 2014, p. B-7.

Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.

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