por Amador Ribeiro Neto
Originalmente publicado em Portugal, o livro tem bastidor interessante. Coube a Luis Maffei convidar doze poetas brasileiros e portugueses. Cada um escreveria um poema atribuindo um signo zodiacal a Camões. Como se sabe, a data de nascimento do poeta português é desconhecida.
Luis Maffei não conseguiu reunir os doze poetas. E nem editora que bancasse o projeto. Quando, certa feita, foi convidado pela Companhia das Ilhas a editar um livro com até 48 páginas, não hesitou em resgatar o projeto que não vingara. E eis Signos de Camões, com 55 páginas, poemas predominantemente longos, belas ilustrações de Mariana Vilhena. Fonte de impressão minúscula. Forçando a vista do leitor.
Mas não é somente a vista que se vê forçada. A leitura também o é. Não se trata de uma restrição à poesia de Luis Maffei. Antes: é um elogio. Ele escreve como quem colhe palavras árduas. E de modo lento. A calmaria que o livro pede, parece encontrar partilha no modo das águas de sua produção.
Tudo flui muito parcamente. Quase tudo é frugal. Ou está rarefeito. Ao poeta interessa um diálogo intenso com a modernidade que tem um pé fincado na tradição. E outro na contemporaneidade.
Assim, não espanta que o livro valha-se de Platão, Dante Alighieri, Shakespeare, Goethe, Adília Lopes, Gil Vicente, Sá de Miranda, Sá-Carneiro, Fernando Pessoa, Augusto dos Anjos, Jorge de Sena, Drummond, Herberto Helder, Vinícius de Moraes, Augusto de Campos, Ana Luísa Amaral, Caetano Veloso. E por aí afora. A tessitura do livro, feita de vários movimentos de muitos poetas encanta, seduz e hipnotiza o leitor.
Ler Signos de Camões é estar sob a ação de vários códigos: pintura, música, teatro, etc. Além do ludismo das citações intratextuais.
Deixo ao leitor perceber o modo como os signos do zodíaco aparecem nos doze poemas do livro. Destaco que Luis Maffei, ao trabalhá-los, lança mão de poemas de forma fixa, de poemas discursivos, de poemas em prosa e da redondilha maior. Mas o verso livre não lhe escapa. Isto dá uma ideia do zelo com o signo poema.
O poeta sabe brincar com sabor. Por exemplo, ao tomar o signo Gêmeos, produz dois sonetos cujas estruturas espelham-se. Ou seja: o primeiro obedece à clássica organização petrarquiana: dois quartetos e dois tercetos. Rimas em ABBA ABBA CDC DCD. O segundo, invertido, tem dois tercetos e depois dois quartetos. Rimas em ABA BAB CDDC CDDC. Entre eles, um dístico, deslocado à direita da página, tematizando angústia e espelho. Alguém nega que seja uma boa sacada?
À semelhança de Camões em Os Lusíadas, o eu-lírico é um desbravador, um errante viajante. Navega pela sintaxe lusitana clássica. Como navega pela oralidade do português brasileiro. E o resultado é pura poesia.
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Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.
Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 06 de outubro de 2014, p. B-7.
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Sobre o Luis Maffei músico: http://www.youtube.com/watch?v=pUsXyLBdqQU
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