por Amador Ribeiro Neto
O interessante é que ser paulista não é critério para ser incluído no livro. O que conta é o poema falar da cidade. Assim, há mineiro, paranaense, carioca, catarinense, baiano, matogrossense, gaúcho e até português, francês. 71 poetas. Mais de 130 poemas.
Não existe amor em SP. Existe amor em SP. Alguns louvando, outros descendo o malho na Pauliceia. A metrópole não passa incólume para estes poetas e, na certa, para os que ficaram fora do livro. Claro. Não há lugar para todos.
Sem obedecer a um critério diacrônico, o organizador teve a liberdade de centrar-se em poemas de melhor qualidade estética, independentemente da quantidade deles produzida em determinada época. Isto confere ao livro um caráter de liberdade e um ponto a favor da expressividade poética.
Embora, isto é fato, alguns poemas deixem a desejar. É o caso de Álvaro Alves de Faria com “Exposição de motivos”: “O problema é que em São Paulo / eu me deparo com o seguinte / problema é que em São Paulo / eu me debato com o problema / seguinte ao que passo a expor: / não sei o que é, / mas a vida machuca / neste quarto mal iluminado / e eu não sei se devo dormir / ou me suicidar”. O poeta se enrola todo para falar de seu problema. Evidentemente que ele não quer expor motivo algum de sua melancolia. Mas a forma de que se vale é tão gasta, tão datada, tão vencida, que os versos pouco, ou nada acrescentam à cena paulista. Ou poética. Fica a intenção de. Não a realização. Pena.
Glauco Mattoso está presente com haicais e sonetos. Dada a extensão desta coluna, opto pelos primeiros, embora todos sejam de excelente qualidade. “Casa de mansarda / não tarda a ser demolida. / Obra de vanguarda”. Sinteticamente o poeta aponta, sarcástico, para o “nonsense” das demolições paulistanas. A cidade, que caminha para o quinto centenário, parece fundada nas últimas décadas. Tal a voracidade da modernidade que a assola/devora.
Donizette Galvão, mineiro que escolheu a capital paulista para viver, não se conforma. Conclui seu poema “A cidade no corpo” enfaticamente: “Esta cidade: minha cela. / Habita em mim / sem que eu habite nela”.
O bom humor encontra em Juó Bananére seu maior intérprete, já que é a marca irreverente deste poeta. Ele inicia “Sodades de Zan Paolo” assim: “Tegno sodades dista Paulicéa, / Dista cidade chi tanto dimiro! / Tegno sodados distu céu azur, / Das belas fighia lá du Bó Ritiro”.
O amor derramado, e paradoxalmente contido, aparece em “pernambucano paulistano”, de Frederico Barbosa: “cada são paulo a que retorno / toca tanto que é ruim // na marginal eu quase choro / só porque me sinto vir // pernambucano paulistano / como tantos por aqui // tenho-a minha toda e tanto / que não a posso possuir”.
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Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.
Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 02 de maio de 2014, p. 7.
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