por Amador Ribeiro Neto
O problema reside na maioria de seus poemas. Que não são poemas propriamente falando. Eis o nó górdio – pra usar uma expressão cara ao quase-poeta. São buscas nada felizes de um coloquialismo que, ao fazer concessão ao prosaísmo, raramente chega ao poético.
E mais: ele funde mitologia e filosofia como se “erudição” fosse garantia de poeticidade. Não é. Pelo contrário: cansa a beleza do leitor.
Claro que há aquele leitor que sente seu ego inflar-se ao decodificar uma referência mitológica. Ou mesmo ao sacar a intertextualidade filosófica. Bem, este é um prazer egoico. Plausível. Não é fruição poética.
Seu livro Porventura (Rio, editora Record, 2012) é um prolongamento do mesmo esquema facilitador do anterior, Guardar (1996). De um lado, relatos helênicos, vocabulário empolado, obsoleto e pomposo. Talvez o Antonio Cícero entenda que cultura clássica, em poesia, seja assim que se “a-presente”. Não é. Vide Kaváfis, Valéry, Eliot, Pessoa. E, entre nós, Mário Faustino.
De outro lado, derrapadas na busca obsessiva pelo coloquial e pelo despojado. Não convence. Sejamos justos: seu amigo, e autor das orelhas de Porventura, Antonio Carlos Secchin, diz exatamente o contrário do que afirmo aqui. Bem, colocações de orelheiros são quase sempre tendenciosas. Sabemos disto.
O livro inicia-se com uma canção do exílio reciclada por uma linguagem chinfrim, em tons de reflexão filo-psicanalíticas. Para terminar numa declaração de amor. E numa confissão: o poeta se diz convicto de que “um ou dois dos meus futuros versos [serão maduros]”.
Bem, é o próprio AC quem diz: versos maduros, só no futuro. E um ou, porventura, dois. Não por menos ele encerra seu livro com o poema “3h47” que cito na íntegra: “Bem que Horácio dizia / preferir dormir bem / a escrever poesia”. AC deveria seguir a lição do mestre.
No poema “O poeta cego” ele abusa dos trocadilhos, das anáforas e dos anagramas. Parece que faz um exercício de aplicação das normas de um manual do tipo Como Produzir um Poema. A primeira, das duas quadras, diz: “Eis o poeta cego. / Abandonou-o seu ego. / Abandonou-o seu ser. / Sem ser nem ver ele verseja”.
Didaticamente AC vai expondo a situação do poeta cego: sem ver e sem ser. Daí o poeta considera um grande achado dizer que “sem ser nem ver” o poeta “VER/seja”. Resultado infame. Trocadilho reles. Inadmissível.
Depois vem a segunda quadra. Eximo-me de transcrevê-la. Por “vergonha alheia”.
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Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.
Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 16 de maio de 2014, p. 7.
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