sábado, 31 de maio de 2014

'O Auto da Compadecida' nas versões de Guel Arraes e Os Trapalhões



por Alana Morais

"Num Sei, só sei que foi assim". O Auto da Compadecida, peça teatral de Ariano Suassuna, é transferida para as telas de cinema em Os Trapalhões no Auto da Compadecida (1987) e O Auto da Compadecida (2000). Um lotou as salas dos chamados cinemas de rua na década de 80, o outro saltou do formato de minissérie para ganhar a telona.

Dirigido por Roberto Farias, que também assina o roteiro em parceria com Suassuna, Os Trapalhões no Auto da Compadecida traz no elenco o quarteto — formado por Didi (João Grilo), Dedé Santana (Chicó), Zacarias (Padeiro) e Mussum (Sacristão/Jesus) — que dá teatralidade e magia circense ao texto. Um diálogo em off dá início ao filme e logo após o espectador é surpreendido pela chegada do circo na cidade, ao som de "Tombei mandei tombar/Buscar barril na beira do mar..." cantarolada pelo palhaço que logo se apresenta como autor da estória que se passa em um vilarejo que vive sob o cabresto do coronelismo, a avareza dos patrões e a cobiça dos representantes da igreja. A chegada do cangaceiro Severino de Aracaju (José Dumont) apavora a cidade e, depois da matança, todos são submetidos ao julgamento no céu diante de um Jesus "queimadinho", do Diabo (Raul Cortez) e da Compadecida (Betty Gofman).

A obra é de uma poética ímpar, uma fotografia fascinante acompanhada de uma trilha sonora pra lá de linda e recebe merecidos aplausos do próprio elenco para dar fim à estória que o palhaço/narrador jura ser verdade.

Do plim-plim para as modernas salas de cinema, sob direção de Guel Arraes e roteiro de Adriana Falcão, a nova versão do Auto da Compadecida ganha elementos de outros dois textos de Ariano Suassuna — A pena e a lei e O Santo e a Porca —, o que dá ainda mais versatilidade para essa produção. Um elenco que dispensa comentários traz Matheus Nachtergaele como o esperto João Grilo e Selton Mello como o medroso apaixonado Chicó.

O ápice do filme acontece no julgamento, não só pelo jogo rápido que a cena propõe, mas por também reunir grandes atores, como Marco Nanini (Severino de Aracaju), Luiz Melo (Diabo) e a digníssima Fernanda Montenegro (Compadecida), que dão um banho de interpretação, deixando a cena um verdadeiro deleite. A caracterização dos personagens e o conjunto de adereços são de encher os olhos, porém os efeitos especiais pecam em alguns momentos, o que não borra a graciosidade do filme. E como não torcer e suspirar pelo casal de apaixonados Chicó e Rosinha (Virginia Cavendish), que terminam felizes para sempre?

Embora essas duas versões da obra do Suassuna sejam as mais conhecidas e premiadas, a primeira versão para o cinema foi A Compadecida (George Jonas, 1969), e vale a pena conferir por ser, também, uma belezura de filme nacional para toda a família.
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Alana Morais: atriz, produtora cultural e assistente social (atua na área de habitação de interesse social). Integra o grupo de pesquisa GEMI (Gênero e Mídia). Como atriz além do teatro participou de dois vídeos-poemas: “Foradesordem” (2011) e “Busca Alguma” (2013), e desde então passou a ter como hobby fazer vídeo-poema (registrado apenas para arquivo pessoal).

Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 11, de 20 de novembro de 2013), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.

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