por Amador Ribeiro Neto
Um livro que sabe ser lúdico e guardar alta voltagem literária. Um livro que se desenha no caminho das formigas. Nas marcas do dedinho do menino que as acompanha selando seu caminho. E ele, distraído, sela o caminho delas. O que era uma linha transmuta-se em várias. O uno se torna múltiplo. Como se o caos se intrometesse no roteiro geneticamente determinado das formigas.
Que criança não gosta de se intrometer na “lógica” da vida? Seja vida adulta, vida dos animais, vida da linguagem? Que criança não é um pouco Bandeira brincando de poeta em “tiradas” mágicas de palavras, gestos e sons inusitados?
Pois Mário Alex Rosa sabe captar este olhar da criança. Este comportamento da criança. Este modus operandi e vivendi da criança. Ele e a Lílian Teixeira. Claramente o livro não existiria sem esta composição verbo-visual. Os dois formam um todo indissolúvel. Como a dança e o bailarino, na observação exata de Valéry.
Tira-se o livro de seu envelope-caixinha e imediatamente ele se abre em mil caminhos que, no início, seguem como um poema em linha reta. Para, lá pelas tantas, bifurcar-se. E, ao final, multiplicar-se em linhas retas e em elipses, entrecruzando, entrelaçando, interpenetrando-se frenética, elétrica e hipnoticamente.
Ao ponto de aquilo que era o lado de trás da folha abrir-se como folha de frente. E daí a história, a ilustração voltam em espelho. Como a vida é. Como a linguagem se faz. Como as formigas reagem.
Um livro delicado. Sutil. Amoroso. Lê-lo é mergulhar no sublime. É imergir no mais profundo alumbramento. Um presente para todas as idades. Dizer isto já virou clichê. Mas o clichê deve ser tomado aqui ao pé da letra. Como se fora enunciado pela primeira vez. O livro é realmente um grande achado dentro da literatura infantojuvenil e adulta. Merece atenção de todos que amam a literatura.
Mário Alex Rosa é mineiro e reside em Belo Horizonte, embora nascido em São João Del Rey. Doutor em Literatura Brasileira pela USP. Tem outro livro infantojuvenil, ABC Futebol Clube e outros poemas (Campina Grande: Editora Bagagem) e dois de poesia: Ouro Preto (São Paulo: Scriptum) e Via Férrea (São Paulo: CosacNaify).
Lílian Teixeira nasceu e reside em Belo Horizonte. Cursou Processamento de Dados e Produção Editorial. Atualmente é aluna do curso de Letras. Autora de O pai que lia pensamentos (Belo Horizonte: Abacatte Editorial). Formigas é seu livro de estreia como ilustradora.
Com Formigas o leitor é chamado a ver/ler/brincar/criar/refletir/imaginar. Enfim, a ser cúmplice deste ludismo apaixonante que Mário Alex e Lílian preparam-nos. Vamos ler, ser e estar. Não importa se em “Atenas ou Barbacena”.
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Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.
Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 20 de junho de 2014, p. 7.
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