terça-feira, 23 de agosto de 2016
As asas de Ythallo Rodrigues
por Samuel Macêdo do Nascimento
Diria Glauber Rocha: “a arte não é só talento, mas sobretudo coragem”... Nesse texto não pretendo entrar detalhadamente na filmografia de Ythallo Rodrigues. As palavras trazidas no texto servem como demonstração pública de afeto para a potência desse jovem, porém intenso, cineasta das terras do sul do Ceará. No Grupo de Estudos Sétima de Cinema, estamos lendo a obra O que é o Cinema, de André Bazin, e nela o crítico – e na minha concepção, teórico – defende que as ideias sobre o que venha a ser Cinema surgem do modo tal qual o conhecemos.
Bazin (2014) traz o mito de Ícaro, personagem da mitologia grega, para demonstrar que assim como o desejo e visualização de Ícaro, de ter asas e voar, as tecnologias utilizadas pela Indústria do Cinema e pelos cineastas, foram sendo geradas nas mentes daquele período para que o cinema total (tal qual conhecemos) existisse. O voo pleno de Ícaro metaforiza o vislumbramento do Cinema, com som, imagem, cor, etc. Bazin ainda nos previne que o cinema ainda está sendo gestacionado, em devir, uma vez que é a última arte, a mais jovem, diferente de suas irmãs Literatura e Teatro, não possui a mesma idade da História.
Portanto, Ythallo Rodrigues, a partir de suas próprias implicações locais, está nesse processo árduo de criação de um Cinema Independente do Cariri. Assisti a alguns de seus filmes: Amor (2010), Lampião (2011), Bem-vindo a Juazeiro do Norte (2015), e percebo como seu movimento criador nos leva, de forma caótica, a desconstruir nossos olhares, sobre o Cinema, sobre nós mesmos e sobre nossa micro – porém singular – realidade. Ythallo é um cineasta dissidente que ao mesmo tempo que demarca territórios, potencializa as possibilidades de fronteiras.
Ythallo aparece como personagem em Estrada para Ythaca (2010), filme da produtora Alumbramento, como fantasma que vive na encruzilhada e nos adverte sobre as consequências das escolhas dos caminhos. “É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”... Num período de tanto conservadorismo político, cineastas como Ythallo Rodrigues instigam nossa fome de pensar e construir outras formas de realidades.
Ythallo Rodrigues dirige o filme experimental Dama da Noite (2007), a ficção Adeus, meu bem! (2005, em parceria com Allison Gomes) e o documentário Seu Alves (2007), além de ter sido produtor de Passos no Silêncio (2008, com Rúbia Mércia). O cineasta é conhecido por seus projetos e ideias constantes. Portanto, torna-se impossível enquadrá-lo num estilo ou escola cinematográfica. Ythallo Rodrigues é responsável por levar a região do Cariri para festivais de cinema, além de firmar alianças com grupos e coletivos que se propõem a construir um cinema brasileiro independente. Independente em relação a grandes Produtoras ou Distribuidoras. Desejamos que as desorientações do cineasta de asas continuem se espalhando pelos territórios insaciados.
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Samuel Macêdo do Nascimento é formado em Comunicação Social (Jornalismo), mestrando em Cultura e Sociedade e membro do Grupo de Pesquisa em Cultura e Sexualidade.
Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 31, de maio de 2016), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.
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