quarta-feira, 19 de julho de 2017
Recife - Janela de Cinema: relato de viagem durante a IX Janela Internacional de Cinema do Recife
por Elvis Pinheiro
Entre os dias 28 de outubro e 06 de novembro de 2016, tanto na sala da Fundação Joaquim Nabuco, no Museu do Homem do Nordeste quanto no pomposo cinema São Luís na rua da Aurora, em frente ao rio Capibaribe, pude acompanhar um grande evento de cinema contemporâneo com exibição de curtas e longas metragens nacionais e internacionais, com direção artística do crítico e festejado diretor de cinema, Kleber Mendonça Filho.
Dividido em sessões especiais de clássicos, lançamentos e filmes baseados na obra de William Shakespeare, longas e curtas em competição, e pequenos programas de curtas variados, o evento contou ainda com palestras sobre produção em cinema e haveria uma conversa com a cineasta argentina Lucrecia Martel, infelizmente cancelada de última hora.
Admito que vi muita coisa, mas também soube dizer não, sem sentir-me culpado. Como também não me senti culpado com os cochilos e pestanejadas em meio à maratona. Faz parte. É filme demais, e nem sempre estamos preparados ou suficientemente motivados para tudo que nos é apresentado. A curadoria também não parte mais de uma única pessoa. É compartilhada com muitos outros profissionais e isso cria, certamente, texturas tão distintas que ao invés de um festival, parece que acompanhamos vários ao mesmo tempo e uns são, verdadeiramente, insuportáveis. Mas que fique claro: maravilhosamente insuportáveis e indispensáveis para a educação do nosso olhar. O que nos faz dormir hoje, pode nos despertar amanhã.
Agora, bem rápido, os filmes que fizeram valer a viagem: Elle, Toni Erdmann, O Ornitólogo, American Reflexxx, O Porteiro do Dia, Gente Bonita, A Morte de Louis XIV, De Palma, Animal Político, Eu Daniel Blake, O Delírio é a Redenção dos Aflitos, Ms. 45, Berlin-Harlem, Martírio, Diamond Island, A Cidade Onde Envelheço, O Auge do Humano, (todo o bloco de curtas “Moeda Corpo”: Alles Wird Gut (Tudo Vai Ficar Bem), Dear Renzo, Prenjak, Pedro), Impeachment, Santa Porque Avalanche, Rua Cuba.
Todos estes filmes estão na minha cabeça. Fui tomado por eles. Surpreenderam-me, encantaram-me, emocionaram-me. O ganhador de Cannes 2016, I, Daniel Blake, indispensável filme político de Ken Loach. Elle vem com Isabelle Huppert impecável numa história cheia de surpresas e humor negro. Toni Erdmann é daqueles filmes que vão enlouquecendo, possui uma das cenas mais surreais e engraçadas que já vi e é todo uma crítica ao sistema empresarial internacional e o que é feito aos seus executivos. Gente Bonita é uma noite no carnaval de Salvador em alas Vips de blocos carnavalescos, com a narrativa construída pelos próprios foliões. A cidade onde envelheço é um filme-abraço à cidade de Belo Horizonte, a Portugal, a amizades e descobertas. A morte de Louis XIV vem com o Jean-Pierre Leaud, a eterna criança de Os Incompreendidos, agora no papel de um velho moribundo que se despede da vida na nossa frente, minuto a minuto de angústia e dor de um monarca. Martírio é um documentário corajoso sobre quem são os índios Guarani-Kaiwuá. Pedro e Prenjak, dois curtas internacionais. O primeiro de Portugal e o outro da Indonésia, que me surpreenderam pela extrema excitação sexual que causam, pela inventividade dos roteiros, pela verdade que carregam. Ms. 45 é dos anos 80 e tem que ser revisto, e mais ainda pelas mulheres, só digo isso. E se posso citar mais algum, termino com o O Ornitólogo, que é a viagem, filme de estrada, suspense, trash, pornô gay, místico, surreal, de terror e natureza com história.
O que deixamos de falar são as pessoas que encontramos nas filas, são as festas e os encontros com gente que estava presente no evento, são as impressões bem particulares de cada sessão, pela companhia, pela solidão, pela aventura de chegar e sair de um filme. O cinema em grandes festivais é ainda mais forte enquanto celebração. Parabéns a todas as pessoas corajosamente envolvidas.
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Elvis Pinheiro é editor da Revista Sétima e professor. Desde 2003 é Mediador de Cinema no Cariri cearense.
Texto originalmente publicado na SÉTIMA: Revista de Cinema (edição 38, de dezembro de 2016), que é distribuída gratuitamente na Região do Cariri cearense. A Revista Sétima é uma publicação do Grupo de Estudos Sétima de Cinema, que se reúne semanalmente no SESC de Juazeiro do Norte-CE.
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