
por Amador Ribeiro Neto
Adriano Espínola (Fortaleza, 1952), radicado no Rio de Janeiro, é professor de literatura brasileira, tendo lecionado na Universidade Federal do Ceará, na Université Stendhal-Grenoble III e na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ensaísta, é autor de livros sobre Gregório de Matos e Sousândrade. Em poesia publicou Fala favela (1981), O lote clandestino (1982), Trapézio (1985), Táxi (1986), Beira-sol (1997) e Praia provisória (2006). Escritos ao sol (Rio de Janeiro: Record, 2015) reúne alguns de seus melhores poemas. Trata-se de excelente antologia de um dos nossos mais expressivos poetas.
A poesia de Adriano Espínola cativa o leitor pelo alto poder de síntese imagética. E pela construção inesperada das imagens. Tudo numa linguagem marcada por alta densidade poética. Que agrada a todos aqueles que buscam na poesia a somatória de elaboração + emoção. Dono de admirável dicção poética, seus poemas tocam o leitor pela limpidez das ideias e da musicalidade. Que formam o fundo da cena, para as imagens destacarem-se em close.
Escritos ao sol abre-se com “Fera”, poema extraído do livro Praia provisória (2006). Cito-o na íntegra, para que o leitor perceba, de imediato, o quilate desta poesia: “Feito um cão solto, / súbito o sol / salta a janela / adentro do quarto. // Inquieto, morde / os punhos da rede, / derruba a sombra / do retrato, // lambe o pé sujo / lá da parede, / fuça a amarela / mancha do espelho, // late: luz! luz! – / depois se enfia, / fiel, no velho / par de chinela. // (Como a cidade / lá fora, fera, / na alva coleira / do novo dia)”.
O cão já fora usado por João Cabral como metáfora do rio em O cão sem plumas. Agora, Adriano Espínola usa-o como metáfora do sol, numa construção poética que tira o máximo proveito do enjambement. Ou seja: uma construção que explora o movimento do sol, mimetizado pelos do cão, na continuidade sintática, rítmica e semântica de um verso, para o seguinte. Tal recurso imprime ao poema uma visualidade cinematográfica que reforça o lirismo solar do poeta. Em Beira-sol (1997), o próprio cão é tema de poema homônimo. E tem cor: é negro. Entre outros movimentos, “rebate com a capa aveludada / o branco abraço do sol”. Nada transcendente. Tudo muito concreto. Exato.

Adriano Espínola é professor de literatura. E elegeu, como corpus de suas pesquisas, dois dos mais célebres poetas de nosso país: Gregório e Sousândrade. Como nos lembra Pound, conhece-se a grandeza de um crítico pela qualidade de suas escolhas. Aqui podemos dizer: conhece-se a magnitude de um poeta pelo desempenho de sua linguagem. Que é a continuidade do universo de vivências historicizadas pelo poeta.
Táxi (1986), um longo e tocante poema que tematiza a cidade e o amor, num poema discursivo, coloquial que também se vale de recursos vanguardistas. Foi traduzido para o inglês pelo também professor e poeta Charles A. Perrone.
Trapézio (1985) nos apresenta haicais de um poeta que sabe tirar proveito de diferentes modalidades da poesia. E aqui a concisão, que esta forma poética exige, cai como uma luva ao modo conciso do poeta.
Adriano Espínola ocupa lugar privilegiado na cena contemporânea de nossa poesia.
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Publicado pelo jornal Contraponto, de João Pessoa-PB. Caderno B, coluna “Augusta Poesia”, dia 07 de agosto de 2015, p. B-7.
Amador Ribeiro Neto é poeta, crítico literário e de música popular. Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor do curso de Letras da UFPB.
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